
Toda a milenar batalha do Evangelho na Terra consiste no esforço hercúleo por resgatar o espírito humano da prisão da matéria para a liberdade do espírito. Do vício para a virtude. Do tormento para a suavidade.
A dificuldade da redenção está no fato de que as sensações ligadas à matéria e ao momento que passa produzem prazeres imediatos, enquanto que as alegrias espirituais - conquanto incomparavelmente mais grandiosas - têm que ser cultivadas paciente e heroicamente nos embates do dia a dia.
Infelizmente, vivemos num meio cultural em que tudo parece empurrar-nos, desde a infância, rumo às atitudes do egoísmo individual e grupal, bem como ao imediatismo do aqui e agora. Quase toda a educação consiste em dotar os novos indivíduos para sobreviver e prosperar por si mesmos, tanto quanto possível, dentro de um entendimento pobre do que sejam sobrevivência e prosperidade.
Ao mesmo tempo, o espírito de grei como que aprisiona o ser ao estreito círculo familiar, primeiro ao de sua origem filial, depois ao da família que ele constitui e entende ser do seu dever preservar e projetar o mais longe e alto possível, ainda que à custa de elementares princípios de fraternidade e de solidariedade humanas.
O homem deveria compreender, no entanto, que, peregrinando por este mundo expiatório, não serão somente a comodidade e o contentamento imediatos, nem a projeção social, própria e do círculo de parentesco, que lhe garantirão a felicidade real, mas, ao contrário, quanto mais tenha feito em prol da autodisciplina e do bem dos semelhantes, independentemente de consangüinidade e de interesses outros, é que mais garantirá ventura inalterável.
A propósito dessa eterna disputa entre o material e o espiritual, o imediato e o remoto, vejamos um apólogo lá das terras do oriente, captado por Malba Tahan e constante do seu livro "Lendas do Céu e da Terra", sob o título "Os três amigos do homem":
"Era uma vez um homem que tinha três amigos. A todos dedicava grande interesse e não os esquecia um só momento.
Um dia o homem foi chamado a comparecer ao Tribunal, perante o Grande Juiz.
Assustado, na incerteza do que poderia acontecer, procurou o primeiro amigo e pediu-lhe auxílio.
- Nada posso fazer em teu favor - respondeu o primeiro amigo. Pagarei, apenas, as despesas de tua viagem!
O homem recorreu ao segundo. Este lhe disse:
_ Tenho muito medo desse Juiz que vai decidir sobre teu destino. Só posso levar-te, meu caro, até a porta do Tribunal.
Diante do embaraço em que se achava, apelou o homem para o último amigo que lhe restava.
O terceiro amigo atendeu, sem hesitar, ao pedido do homem: acompanhou-o até a presença do Juiz e esforçou-se, com dedicação e carinho, pela sua absolvição.
Sabem quais são os três amigos do homem?
O primeiro é o Dinheiro: o segundo, a Família e o terceiro, as Boas Ações.
Quando o homem morre e é levado ao Tribunal de Deus, o Dinheiro não o acompanha, apenas pode custear-lhe um féretro mais ou menos pomposo; a Família, compungida, vai levá-lo até o cemitério, passando a olvidar-lhe a memória desde o retorno. As Boas Ações é que vão com ele ao Supremo Julgador e falam alto em seu favor..."
(Autor: Malba Tahan, extraído do livro: Lendas do Céu e da Terra)
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