sábado, 19 de abril de 2008

Deus existe


Era sexta-feira e a professorinha primária se dirigia a seus queridos alunos, na última aula da semana, falando-lhes da Religião...

Esforçando-se por lhes provar a existência de Deus, dizia:

-Vocês já ouviram de manhã cedinho, nem bem o dia amanhece, o passaredo cantando nos ramos floridos das árvores? Eles entoam um Hino ao Criador de todas as coisas, eles louvam a Deus!

- Já observaram o murmúrio das águas que deslizam pela encosta da montanha? É um Hino de Amor, que a Natureza entoa a Deus!

- Já contemplaram, à beira-mar, o ir e vir perene das ondas verdes, com sua espuma se espalhando na areia branca da praia? É o mar louvando o Criador de todas as coisas: Deus!

- Já admiraram as nuvenzinhas brancas, que bailam no horizonte além, contrastando com o azul do céu? É o mundo que nos cerca, louvando a Deus, nosso Criador!

- Não é verdade, portanto, crianças, que Deus existe?

- Sim, senhora! – responderam todos.

Isto é, todos não. Pedrinho, um garoto esperto e muito comunicativo, levantou-se e disse:

- Professora, eu não creio em Deus. Achei muito bonito o que a senhora falou, mas não me convenci da existência de Deus. Quero ver Deus! Se a senhora me mostrar Deus, então eu acreditarei nEle!...

E, por mais que a professora se esmerasse em seus argumentos, Pedrinho permanecia irredutível:

- Não adianta, professora! Eu quero ver Deus!...

A mestra encerrou como pôde sua aula e lá se foi para a casa de seus pais, numa cidade próxima, a fim de passar o final de semana.

Tempos depois, passava pelo colégio o inspetor escolar que, após a visita rotineira, perguntou à professora se havia algum problema ou alguma dificuldade a resolver e ela se lembrou logo de Pedrinho, o garoto que desejava ver Deus, e lhe narrou tudo o que fazia para convencê-lo, mas debalde.

O inspetor prometeu ajudá-la e, momentos após, dirigindo-se aos alunos, tocou no assunto combinado: provas da existência de Deus. Repetiu todos os argumentos da jovem mestra e ainda aduziu outros que no momento conseguiu, fazendo, no fim da explanação, a pergunta fatal:

- Não é verdade, meus alunos, que, depois de tudo o que lhes falei, ninguém mais duvida da existência de Deus? Não é verdade que Deus existe?

E a turma inteira confirmou as palavras do inspetor, num perfeito e uníssono jogral:

- Sim, senhor, Deus existe!

Somente um aluno permanecera indiferente e impassível. Mal terminara o entusiasmo da turma, aplaudindo as palavras do inspetor, nosso Pedrinho se levantou e confessou sua dúvida cruel: precisava ver Deus, para então acreditar na sua existência.

O inspetor, quando foi inteirado do problema da professora, pediu-lhe dois copos com água e num deles colocara açúcar, tendo, porém, antes, o cuidado de coar várias vezes a água açucarada, de modo a não se poder saber, a olho nu, qual dos dois era o de água adocicada e cobrira com um guardanapo os dois copos – um com água e açúcar e outro com água natural – apresentando ambos a mesma limpidez.

- Está bem, meu filho – falou-lhe o inspetor. – Vou ajudá-lo a ver Deus. Você está vendo estes dois copos com água? – disse-lhe, retirando o pano que cobria os dois copos.

- Sim, senhor! – respondeu-lhe Pedrinho. – Ver é comigo, pois, só creio no que posso ver!

- Pois bem. Um dos dois copos tem água com açúcar. Você é capaz de me dizer qual deles?

Para logo, o menino olhou por cima dos dois copos, esperando encontrar cristais de açúcar no fundo de um deles. Nada descobriu, porém.

Já ia batendo em retirada, frustrado, diante dos colegas, que aguardavam, ansiosos, o desfecho esperado: a conversão do descrente colega.

Entretanto, o inspetor prosseguiu:

- Vamos, Pedrinho, não desista!

- O senhor me deixa segurar os copos?

- À vontade, rapaz, faça como quiser!

Pedrinho, então, inverteu a minuciosa inspeção, passando a olhar... por baixo dos dois copos e o resultado foi nenhum... Cabisbaixo, ia-se retirando, derrotado, ante os cochichos zombeteiros dos colegas, mas o inspetor impediu-lhe a saída, animando-o:

- Vamos, Pedrinho, tente mais uma vez!

Pedrinho parou um pouco, como que refletindo e lhe propôs:

- O senhor me deixar provar?

- Pois não, Pedrinho, esteja à vontade!

Mais calmo, já meio esperançoso, o menino toma do primeiro copo, prova-lhe a água e nada acha. Pega no segundo copo e exclama, vitoriosamente:

- Achei! Achei! É este o que tem açúcar!...

- Como foi que você descobriu? – indagou o inspetor.

- Ah! Foi fácil. Eu senti...

- Pois bem, meu filho, Deus também é assim: não se vê, se sente!... Quando você refletir melhor, haverá de sempre sentir Deus em tudo e em todas as coisas: no mais pequenino grão de areia, que o vento rola, até nos gigantescos mundos, que rodopiam no Infinito. E arrematou, concludente:

- Deus não se vê, se sente!

Pedrinho não meneou afirmativamente a cabeça, concordando, de pronto, com as palavras do experimentado inspetor, porém, nunca mais negou a existência de Deus. (José Jorge)

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