sábado, 19 de abril de 2008

Um dia para o homem Jesus


A humanidade está necessitando urgentemente de estabelecer um dia para reverenciar o homem Jesus de Nazaré.

Explico-me: o dia ou dias pretensamente a Ele dedicados não o são efetivamente. O escapismo humano tem conseguido, ao longo do tempo, desviar o foco das atenções. Abstrai-se daquilo que é essencial e que toca o âmago dos problemas, para ater-se, muito compungidamente, na aparência, às exterioridades. Assim é que, com relação à figura do Mestre, à medida que passa o tempo, mais se acentua e comemora tudo o que está ligado à Sua memória, com exceção dEle mesmo. Celebra-se tudo o que está em torno do Mestre e esquece-se o que constitui todo o motivo de sua vinda e sacrifício: o ensino moral!

Senão, vejamos.

No Natal, toda a Cristandade reverencia... o menino Jesus. Lembrando-se, ternamente, da figura do Redentor na manjedoura, evoca-se a sagrada família, exalta-se a ternura da criança excelsa, armam-se milhares de presépios e... todos entram na euforia do Natal. Distribuem-se presentes, o comércio age febrilmente, as propagandas intensivas e vistosas estimulam o consumismo de todos, a lei determina que os empregadores paguem um salário extra, para atender a tal regozijo, muitos viajam e outros tantos participam de ofícios religiosos solenes em torno do... nascimento de Jesus.

Em seguida, há a pausa de uns três meses e depois o movimento se repete, com uma diferença: o motivo agora é... a morte do Senhor. Na Semana Santa, com maior contrição, todos rememoram o grande sacrifício do Salvador. Histórias são contadas, filmes exibidos, textos das sagradas escrituras são lidos, sermões relembram as cenas tocantes da perseguição, o processo e a execução na cruz. Nalguns lugares, procedem-se até encenações em cenários naturais. Tudo em torno da morte, do sacrifício do Senhor. Legiões de pessoas, porém, estão menos preocupadas com o motivo da comemoração em si do que com os feriados e a oportunidade especial de viajar, passear, cumprir planos previamente elaborados.

Pouco mais de um mês após, é maio, o mês das flores, quando se comemora o chamado Dia das Mães. E a figura maior das comemorações é Maria, a mãe de Jesus, paradigma de todas as mães. A homenagem é muito justa, naturalmente, mas dirigida à mãe do Mestre e não a Ele próprio.

No mês seguinte, os homenageados são... os apóstolos do Senhor. E, estranhamente as comemorações são feitas com festas e mais festas, bailes, fogueiras, comidas típicas, alegrias ruidosas! Paulo, Pedro, João, o Batista e o Evangelista, personagens que deram o melhor de si em favor do Evangelho nascente, inclusive a própria vida; que viveram na austeridade e renúncia são homenageados paradoxalmente com festas muito pouco espirituais... De qualquer forma, os reverenciados são... os discípulos do Senhor. E então, em dezembro, tudo se repete.

Por que, afinal de contas, os homens parecem encontrar tão grande dificuldade em entender que a figura central disso tudo é Ele mesmo – Jesus, o Divino Mestre – enviado para redimir a Humanidade, indicando-lhe o caminho da Verdade e da Vida, para que se liberte do chavascal do erro e do sofrimento?

Ponderando-se a questão, concluímos que na verdade o que ocorre não é desentendimento quanto ao real sentido das coisas, mas comodismo mesmo, gosto pelas superficialidades e prazeres, com fuga deliberada dos deveres mais graves, porque centrando-se na figura do homem Jesus, seus objetivos, seus ensinos, encontra-se com muita coisa que incomoda e dá o que pensar.

“Não resistais ao mal. Se alguém vos bater na face direita, apresentai-lhe também a outra... Não negueis a quem vos pede emprestado. Se alguém vos obrigar a caminhar mil passos, ide com ele mais dois mil...” E há tanta gente reivindicando direitos, disputando vantagens, por métodos nem sempre pacíficos, promovendo movimentos paredistas, quebra-cabeças...

“Bem-aventurados os pobres de espírito... Não ajunteis para vós tesouros que a traça corrói, a ferrugem consome e os ladrões desenterram e roubam. Ajuntai tesouros do espírito, que não estão sujeitos a nada disso e que vos acompanham na passagem para a outra vida. É mais fácil fazer passar um cabo pelo fundo de uma agulha do que...” Mas as necessidades da vida material são tantas e a luta pela sobrevivência tão árdua! Até mesmo quando já se tem o suficiente para viver e garantir a família... será errado continuar ganhando, amealhando, melhorando cada vez mais as condições de vida? E o futuro, as necessidades dos dependentes? E os juros do overnight, do open market, a mais de 50%, Senhor?! E os dividendos, debêntures, ágios?... Como conciliar uma coisa com outra?

“Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. Mas, Senhor, há tanta gente antipática por aí!

“Perdoai não sete vezes, mas setenta vezes sete...” Bem, tem certas coisas que não dá para perdoar!

“Quando derdes um festim, convidai os pobres e os estropiados... Ide e pregai, curai os enfermos, limpai os leprosos, daí vista aos cegos, expeli os maus espíritos em meu nome...” mas, Senhor, conviver com essa gente? E será que conseguimos mesmo alguma coisa estendendo sobre eles as nossas mãos? Tem que rezar muito, abrir mão de muita coisa!...

“E aquele dentre vós que quiser ser meu discípulo, a si mesmo se negue, tome sua cruz e siga-me...”

Bem, já compreendemos porque o homem Jesus anda tão esquecido.

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