A professora Angélica não era considerada uma pessoa equilibrada, em razão de suas esquisitices.
Os seus alunos da Escola de 1º grau, onde ensinava desde há muitos anos, tinham-na na conta de uma pessoa estranha.
Embora fosse excelente mestra, muitas vezes era surpreendida, quando nas suas viagens de ida-e-volta do lar à escola, com gestos e movimentos de mãos que não condiziam com a sua posição de educadora.
Dona Angélica residia numa cidadezinha e ensinava numa vila próxima.
Os dois lugares se comunicavam por meio da estrada-de-ferro.
Diariamente ela tomava o trem, sentando-se ao lado da janela, quando ia à aula e, quase sempre retornava para casa sentada no mesmo lugar.
As crianças faziam zombaria, criticavam-na, mas ela não sabia.
Mesmo alguns pais irresponsáveis, que se davam à maledicência, comentavam com certa falta de caridade:
- "É uma boa educadora, - diziam com malícia, para logo completarem, - porém completamente maluca."
E punham-se a rir, impiedosamente.
Os anos se passavam e a situação continuava a mesma.
Várias gerações receberam da bondosa e dedicada professora ensinamentos valiosos e abençoados.
Ela era uma pessoa de boas maneiras, calma e gentil, mas não muito bem compreendida.
Envelhecia no exercício do dever de preparar as crianças para um futuro melhor, com espírito de abnegação e devotamento quase maternal.
Certo dia em que viajava para a sua querida Escola, com diversas crianças na mesma classe do comboio, movimentando, de quando em quando, suas mãos, enquanto as crianças na parte de trás sorriam maliciosamente, Alberto, seu aluno de dez anos, que cursava a 4ª série, porque amava sua mestra, aproximou-se dela, sentou-se ao seu lado e, com ternura, perguntou-lhe:
- Professora, por que você insiste em continuar com essas atitudes loucas?
- O que deseja dizer, meu filho? - interrogou, surpresa a bondosa mestra.
- Ora, professora - continuou ele, - você fica dando adeuses para os animais, nos pastos, abanando as mãos... Isto não é loucura?
A mestra amiga compreendeu e sorriu. Sinceramente emocionada, chamou a atenção do aluno, dizendo:
- Veja esta bolsa. Nota o que há aí dentro? - E apontou para a intimidade do objeto de couro forrado.
- Sim - respondeu Alberto.
- Sabe o que é? - Insistiu.
- Não, senhora.
- É pólen de flores, são sementes miúdas... Observe bem. Há quase vinte anos eu passo por este caminho, indo e vindo da escola. A estrada antes era feia, árida, desagradável.
Eu tive a idéia de a embelezar, semeando flores. Desse modo, de quando em quando, reúno sementes de belas e delicadas flores do campo e as atiro pela janela... Sei que cairão em terra amiga e acarinhadas pela primavera se transformarão em plantas a produzirem flores, dando cor à paisagem, criando alegria. Como sempre passo por aqui eu gostarei de que pelos meus caminhos haja sempre beleza a fim de agradar a todos que também transitarão por estes caminhos.
Calou-se por um pouco e depois disse:
- Alberto, meu filho. Na vida, todos somos semeadores. Há uns que semeiam flores e descobrem belezas, perfumes, frutos e outros que semeiam espinhos e se ferem nas pontas agudas. Ninguém vive sem semear, seja o bem, seja o mal. Felizes são aqueles que por onde passam deixam sementes de amor, de bondade, de flores... Nunca te esqueças disso, entendeste?
- Sim, professora. - Respondeu o aluno com emoção. - Eu também hei de semear flores... Muito obrigado!
Franco, Divaldo Pereira. Da obra: O Semeador. Ditado pelo Espírito Amélia Rodrigues.
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