João comia. João dormia.
Tinha pouco o que fazer.
Passeava, andava e ria,
Mas João queria morrer.
Dizia que o mundo é falso,
Despenhadeiro traidor,
Senzala de crueldade,
Toda cravada de dor.
Por mais que o guia buscasse
Despertá-lo para o bem,
Tudo inútil. João clamava
Xingando como ninguém.
O mentor rogava calma
No serviço meritório,
João respondia que o mundo
É um horrendo purgatório...
Afirmava ouvir apenas
Pragas, lamentos e ais.
E rematava: - “meu guia,
Agora não posso mais...
Quero a sua companhia,
Preciso mudar de sorte,
Colaborar, ao seu lado,
Na vida depois da morte...”
E tanto pediu repouso
Na chorança sem limite
Que o pobre desencarnou,
A toque de meningite.
Sob os cuidados do guia,
João acordou, foi tratado...
O mentor, ao vê-lo forte,
Anunciou-lhe, afobado:
-“João amigo, eis o momento!...
Você queria morrer,
Agora venha comigo,
Servir é o nosso dever.”
O moço que detestava
Disciplina, horário e prova,
Começou desapontado
A imprevista vida nova.
Seguindo os passos do guia,
Entre surpresas crescentes,
Passava, dias e dias,
Doando forças aos doentes;
Amparava hansenianos,
Balsamizava feridas,
Corria sempre em socorro
De crianças desvalidas.
Gastava nos hospitais,
Às vezes, noites inteiras,
Garantindo a vigilância
De enfermeiros e enfermeiras.
O protetor sem repouso
Parecia não ter paz,
Onde surgisse em auxílio,
João devia vir atrás.
Certo dia, João, cansado,
Disse aos guia: - “não agüento,
Não mais agüento a pedreira
De prisão e sofrimento...”
Pede o guia: - “Fala, filho!...”
E chorando gritou João:
-“Eu quero viver na Terra,
Prefiro a reencarnação...”
Xavier, Francisco Cândido. Da Obra: “Loja de alegria”. Ditado pelo Espírito Jair Presente
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